Dezenas de escadas de peixes foram construídas em barragens de reservatórios brasileiros, mas são raros os estudos acerca de suas eficiências como instrumentos de conservação da ictiofauna Neotropical, em especial de espécies migradoras. Neste contexto, o presente estudo teve como objetivo avaliar a seletividade específica no ingresso e ascensão de peixes na escada localizada junto à barragem de Lajeado (UHE Luis Eduardo Magalhães, rio Tocantins). Amostragens foram realizadas mensalmente de novembro de 2002 a outubro de 2003 nos tanques de descanso da escada, utilizando tarrafas, e no trecho a jusante, utilizando redes de espera. A avaliação da seletividade no ingresso da escada foi realizada através da comparação da ocorrência, abundância relativa, dominância e congruência dos ranks de abundância de espécies migradoras e não migradoras na escada e no trecho imediatamente a jusante. A riqueza e abundância específica nos diferentes tanques de descanso foram utilizadas para avaliar a seletividade ao longo da escada. Os efeitos das variações temporais do nível hidrométrico de jusante e da velocidade de fluxo na seletividade foram também analisados. Das 130 espécies registradas a jusante, 63,2% foram capturadas na escada, com claro favorecimento das espécies migradoras. Entretanto, mais de 2/3 das capturas pertenceram a apenas três espécies (Rhaphiodon vulpinus, Psectrogaster amazonica e Oxydoras niger). Embora a maioria das espécies que ingressa na escada possa alcançar seu topo, constatou-se uma redução pronunciada na abundância. Variações temporais no nível da água a jusante da barragem influenciaram a riqueza e a abundância de peixes que se concentram na entrada e dentro da escada, com redução nos valores durante períodos de níveis baixos. Já na escada, a velocidade de fluxo de 2,3 m.s-1, embora também seletiva, mostrou-se mais adequada à ascensão de peixes em relação a de 2,8 m.s-1. Conclui-se, portanto, que o ingresso e a ascensão de peixes na escada não são congruentes com a composição e relações de abundância das espécies no trecho a jusante. O conjunto de espécies que efetivamente ascende a escada é dominado por poucas espécies, podendo incluir entre as dominantes aquelas que não necessitam ser transpostas. Dessa maneira, a seletividade se constitui num importante gargalo nas iniciativas de transposição de peixes visando a conservação dos estoques ou da biodiversidade, sendo urgente a revisão do processo decisório sobre a construção destes dispositivos e a avaliação acerca do funcionamento daquelas já construídas.
Although dozens of fish ladders have been constructed at dams of Brazilian reservoirs, there are few studies evaluating their efficiency as a tool for the conservation of Neotropical ichthyofauna, especially for migratory species. Therefore, the present study evaluated the selectivity of the species that entered and ascended the fish ladder located next to Lajeado Dam (Luis Eduardo Magalhães Hydroelectric Power Plant) on the Tocantins River. Samples were taken monthly from November, 2002 through October, 2003, in the resting pools of the ladder, using cast nets, and in the downstream stretch, using gillnets. The selectivity of the ladder in attracting fish was evaluated by comparing the occurrence, relative abundance, dominance and the congruence of abundance ranks of migratory and non-migratory species in the ladder and in the stretch of river immediately downstream. Species richness and fish abundance in the resting pools were used to evaluate selectivity along the ladder. The effects on selectivity by temporal variations in water level downriver and maximum flow velocity in the fish ladder were also analyzed. Out of the 130 species recorded downriver, 62.3% were caught in the ladder, and migratory species were clearly favored. However, more than 2/3 of the catch belonged to only three species (Rhaphiodon vulpinus, Psectrogaster amazonica and Oxydoras niger). Although the majority of the species that entered the ladder were able to reach its top, there was a sharp reduction in abundance of individuals towards the top. Temporal variations in the water level below the dam influenced richness and abundance of fish concentrated downstream and in the ladder, with lower values during periods of low water. In the ladder, a maximum flow velocity of 2.3 m/s, although also selective, proved to be more appropriate for fish ascension than a velocity of 2.8 m/s. It was concluded that the entry and ascension of the fish in the ladder were not congruent with their proportions in the downriver stretch: fish samples in the ladder were clearly dominated by a few species, including some that do not need to be translocated. Thus, selectivity constitutes an important bottleneck to initiatives for translocating fish aimed at conserving their stocks or biodiversity. It is urgent to review the decision-making process for the construction of fish passages and to evaluate the functioning of those already operating.
